Quando a Existência Desafia os Dogmas

ENGLISH / ESPANOL

O fracasso das morais fossilizadas, do controle social e da falsa autoridade diante do movimento inevitável da vida

A vida não pede licença para existir. —  E é exatamente isso que mais incomoda sociedades adoecidas pelo controle, viciadas em regras anacrônicas e padrões morais fossilizados. A vida acontece — indomável, imprevisível, soberana — enquanto códigos sociais tentam, em vão, enquadrá-la em formulários éticos ultrapassados, redigidos por consciências que temem tudo o que não controlam.

Chegamos a esta dimensão por gestos humanos imperfeitos. Sempre foi assim. Nunca será diferente. A história da humanidade — inclusive a que se autodenomina sagrada — jamais foi escrita por seres moralmente assépticos. Ainda assim, persiste a arrogância de uma sociedade que se proclama evoluída, mas permanece mentalmente aprisionada a dogmas rançosos, repetidos como mantras por consciências domesticadas.

Davi, Salomão e tantos outros personagens reverenciados pelas tradições religiosas dificilmente sobreviveriam ao tribunal moral contemporâneo — um tribunal raso, barulhento e hipócrita, que confunde virtude com obediência cega a padrões sociais. No passado, ao menos se reconhecia a contradição humana como parte constitutiva da existência. Hoje, finge-se pureza enquanto se pratica julgamento seletivo, desprovido das mínimas condições lógicas, éticas e morais.

As regras sociais que pretendem legitimar ou deslegitimar a origem de um ser humano não expressam ética elevada; revelam, isso sim, atraso civilizatório. São resíduos de uma mentalidade medieval que se recusa a morrer e apenas troca de vocabulário para parecer moderna.

O universo não reconhece “filhos legítimos” ou “ilegítimos”.
A natureza não consulta nem legitima cartórios morais.
A vida não carrega culpa por ter acontecido.

Essas categorias não nascem da sabedoria, mas do medo: medo da liberdade, da diferença, da própria fragilidade moral. E, sobretudo, do egoísmo que não admite que outros tenham chegado à existência pelos mesmos meios dos quais tantos se beneficiaram — sem mérito algum. Criam-se regras para compensar a incapacidade de pensar, sentir e evoluir.

É patético que sociedades que se dizem progressistas ainda insistam em classificar seres humanos pela forma como nasceram. É grotesco que, em pleno século XXI, o moralismo continue sendo usado para justificar exclusão, humilhação e desprezo existencial. Não se trata de valores; trata-se de controle social disfarçado de virtude.

Há uma violência estrutural nesse tipo de pensamento. Uma violência silenciosa, mas profundamente corrosiva. Ela não apedreja corpos — apedreja dignidades, apedreja almas. Não queima pessoas em praças públicas, mas incinera reputações, histórias e origens. A fogueira mudou de método, não de intenção.

O verdadeiro atraso não está nos atos humanos imperfeitos que geram vida, mas na persistência de padrões mentais que negam a sacralidade da existência. O erro não é nascer fora das normas; o erro é manter normas que não resistem à mais simples reflexão ética.

A racionalidade sem empatia — tão celebrada por moralistas de ocasião — não é inteligência superior. É apenas estupidez sofisticada, uma brutalidade com verniz acadêmico. Há mais dignidade em um animal que protege sua cria do que em um ser humano que usa discursos morais para justificar desprezo.

Este artigo não defende irresponsabilidade. Defende consciência.
E consciência exige coragem para afirmar o óbvio que muitos evitam: nenhuma regra social tem autoridade para invalidar a existência de alguém. Nenhuma tradição tem legitimidade para humilhar quem simplesmente existe.

A vida é sempre maior que os códigos que tentam regulá-la.
Mais ampla que as normas que tentam contê-la.
Mais sagrada que os dogmas que tentam julgá-la.

Todos somos, sem exceção, criaturas do mesmo mistério. Portadores de dignidade intrínseca, não concedida por sociedade alguma. O propósito da existência não é obedecer padrões herdados de consciências medíocres, mas expandir lucidez, empatia e discernimento.

Criticar os pais por terem sido simplesmente humanos é uma forma disfarçada de covardia moral e profunda ingratidão. É mais fácil julgar o passado do que assumir responsabilidade pelo presente. Honrá-los, mesmo reconhecendo suas falhas, é compreender que foram canais — imperfeitos, sim — de algo infinitamente maior do que eles mesmos.

Talvez a verdadeira evolução não esteja em criar mais regras, mas em desmontar aquelas que já provaram ser inúteis. Em abandonar o moralismo patético e falso que divide, rotula e empobrece o espírito humano.

Porque a vida não pede licença.
Nunca pediu. Não pedirá.
E continuará acontecendo — apesar das regras, apesar dos dogmas, apesar dos que insistem em não evoluir.

Nascidos em quaisquer circunstâncias, todos deveriam reconhecer que seus pais — homens e mulheres — desafiaram contextos, exerceram o direito primordial de procriar e, por isso, não merecem rótulos de promiscuidade ou irresponsabilidade. Pelo contrário: foram mentores da vida.

Compreender que os pais são instrumentos do universo — canais entre o plano espiritual e o plano físico — impõe reconhecimento e respeito.
Isso transcende contextos sociais, econômicos ou culturais.
É, antes de tudo, um princípio da própria vida.

_____________________

ENGLISH 

When Existence Challenges Dogmas

The failure of fossilized morals, social control, and false authority in the face of life’s inevitable movement

Life does not ask permission to exist. And that is precisely what most disturbs societies sickened by control, addicted to anachronistic rules and fossilized moral standards. Life happens—untamed, unpredictable, sovereign— while social codes attempt, in vain, to confine it within outdated ethical forms, drafted by consciences that fear everything they cannot control.

We arrive in this dimension through imperfect human gestures. It has always been so. It will never be different. The history of humanity—including the history that calls itself sacred—was never written by morally antiseptic beings. Yet the arrogance persists of a society that proclaims itself evolved while remaining mentally imprisoned by rancid dogmas, repeated like mantras by domesticated consciences.

David, Solomon, and so many other figures revered by religious traditions would hardly survive the contemporary moral tribunal—a shallow, noisy, hypocritical court that confuses virtue with blind obedience to social standards. In the past, human contradiction was recognized as a constitutive part of existence. Today, purity is feigned while selective judgment is practiced, devoid of the most basic logical, ethical, and moral foundations.

Social rules that claim to legitimize or delegitimize the origin of a human being do not express elevated ethics; they reveal civilizational backwardness. They are residues of a medieval mentality that refuses to die and merely changes its vocabulary to appear modern.

The universe does not recognize “legitimate” or “illegitimate” children.
Nature does not consult or validate moral registries.
Life bears no guilt for having occurred.

These categories are not born of wisdom, but of fear: fear of freedom, fear of difference, fear of one’s own moral fragility. And, above all, the selfishness that cannot accept that others came into existence through the same means from which so many have benefited—without any merit whatsoever. Rules are created to compensate for the inability to think, feel, and evolve.

It is pathetic that societies that call themselves progressive still insist on classifying human beings by the circumstances of their birth. It is grotesque that, in the twenty-first century, moralism continues to be used to justify exclusion, humiliation, and existential contempt. This is not about values; it is about social control disguised as virtue.

There is a structural violence in this kind of thinking. A silent violence, but profoundly corrosive. It does not stone bodies; it stones dignity, it stones souls. It does not burn people in public squares, but it incinerates reputations, histories, and origins. The bonfire has changed its method, not its intention.

True backwardness does not lie in imperfect human acts that generate life, but in the persistence of mental patterns that deny the sacredness of existence. The error is not being born outside the norms; the error is maintaining norms that cannot withstand the simplest ethical reflection.

Rationality without empathy is not superior intelligence. It is merely sophisticated stupidity—brutality with an academic veneer. There is more dignity in an animal that protects its offspring than in a human being who uses moral discourse to justify contempt.

This article does not defend irresponsibility. It defends consciousness.
And consciousness requires the courage to affirm the obvious that many avoid:
no social rule has the authority to invalidate someone’s existence.
No tradition has the legitimacy to humiliate those who simply exist.

Life is always greater than the codes that attempt to regulate it.
Broader than the norms that try to contain it.
More sacred than the dogmas that seek to judge it.

All of us, without exception, are creatures of the same mystery. Bearers of intrinsic dignity, not granted by any society. The purpose of existence is not obedience to inherited standards, but the expansion of lucidity, empathy, and discernment.

Criticizing parents for having been simply human is a disguised form of moral cowardice and profound ingratitude. It is easier to judge the past than to assume responsibility for the present. Honoring them—even while recognizing their flaws—is to understand that they were channels, imperfect yet necessary, of something infinitely greater than themselves.

Perhaps true evolution lies not in creating more rules, but in dismantling those that have already proven useless. In abandoning the pathetic and false moralism that divides, labels, and impoverishes the human spirit.

Because life does not ask permission.
It never did. It never will.
And it will continue to happen—despite the rules, despite the dogmas, despite those who insist on not evolving.

Born under any circumstances, all should recognize that their parents—men and women—challenged contexts, exercised the primordial right to procreate, and therefore do not deserve labels of promiscuity or irresponsibility.On the contrary: they were mentors of life.

To understand that parents are instruments of the universe—channels between the spiritual plane and the physical plane—demands recognition and respect.
This transcends social, economic, or cultural contexts.
It is, above all, a principle of life itself.

_______________

.

ESPANOL 

Cuando la Existencia Desafía los Dogmas

.

El fracaso de las morales fosilizadas, del control social y de la falsa autoridad frente al movimiento inevitable de la vida

La vida no pide permiso para existir. Y es precisamente eso lo que más incomoda a las sociedades enfermas de control, adictas a reglas anacrónicas y a patrones morales fosilizados.
La vida sucede —indómita, imprevisible, soberana— mientras los códigos sociales intentan, en vano, encasillarla en formularios éticos obsoletos, redactados por conciencias que temen todo aquello que no pueden controlar.

Llegamos a esta dimensión a través de gestos humanos imperfectos.
Siempre ha sido así. Nunca será diferente.
La historia de la humanidad —incluso la que se autodenomina sagrada— jamás fue escrita por seres moralmente asépticos.
Aun así, persiste la arrogancia de una sociedad que se proclama evolucionada, pero que permanece mentalmente prisionera de dogmas rancios, repetidos como mantras por conciencias domesticadas.

David, Salomón y tantos otros personajes venerados por las tradiciones religiosas difícilmente sobrevivirían al tribunal moral contemporáneo:
un tribunal superficial, ruidoso e hipócrita, que confunde la virtud con la obediencia ciega a los estándares sociales.
En el pasado, la contradicción humana era reconocida como parte constitutiva de la existencia.
Hoy se finge pureza mientras se practica un juicio selectivo desprovisto de ética, lógica y coherencia moral.

Las reglas sociales que pretenden legitimar o deslegitimar el origen de un ser humano no expresan ética elevada; revelan atraso civilizatorio.
Son residuos de una mentalidad medieval que se niega a morir y apenas cambia de vocabulario para parecer moderna.

El universo no reconoce “hijos legítimos” o “ilegítimos”.
La naturaleza no consulta ni valida registros morales.
La vida no carga culpa por haber ocurrido.

Estas categorías no nacen de la sabiduría, sino del miedo:
miedo a la libertad, a la diferencia y a la propia fragilidad moral.
Y, sobre todo, del egoísmo que no admite que otros hayan llegado a la existencia por los mismos medios de los que tantos se beneficiaron —sin mérito alguno.
Se crean reglas para compensar la incapacidad de pensar, sentir y evolucionar.

Es patético que sociedades que se dicen progresistas aún clasifiquen a los seres humanos por la forma en que nacieron.
Es grotesco que, en pleno siglo XXI, el moralismo siga siendo utilizado para justificar exclusión, humillación y desprecio existencial.
No se trata de valores; se trata de control social disfrazado de virtud.

Existe una violencia estructural en este tipo de pensamiento.
Una violencia silenciosa, pero profundamente corrosiva.
No apedrea cuerpos; apedrea dignidades, apedrea almas.
No quema personas en plazas públicas, pero incinera reputaciones, historias y orígenes.
La hoguera cambió de método, no de intención.

El verdadero atraso no reside en los actos humanos imperfectos que generan vida, sino en la persistencia de patrones mentales que niegan la sacralidad de la existencia.
El error no es nacer fuera de las normas; el error es mantener normas que no resisten la reflexión ética más elemental.

La racionalidad sin empatía no es inteligencia superior.
Es estupidez sofisticada: brutalidad con barniz académico.
Hay más dignidad en un animal que protege a su cría que en un ser humano que utiliza discursos morales para justificar el desprecio.

Este artículo no defiende la irresponsabilidad. Defiende la conciencia.
Y la conciencia exige el coraje de afirmar lo obvio que muchos evitan:
ninguna regla social tiene autoridad para invalidar la existencia de alguien.
Ninguna tradición tiene legitimidad para humillar a quien simplemente existe.

La vida es siempre más grande que los códigos que intentan regularla.
Más amplia que las normas que pretenden contenerla.
Más sagrada que los dogmas que buscan juzgarla.

Todos somos, sin excepción, criaturas del mismo misterio.
Portadores de una dignidad intrínseca, no concedida por ninguna sociedad.
El propósito de la existencia no es obedecer patrones heredados de conciencias mediocres, sino expandir lucidez, empatía y discernimiento.

Criticar a los padres por haber sido simplemente humanos es una forma disfrazada de cobardía moral y profunda ingratitud.
Es más fácil juzgar el pasado que asumir responsabilidad por el presente.
Honrarlos —aun reconociendo sus fallas— es comprender que fueron canales imperfectos de algo infinitamente mayor que ellos mismos.

Tal vez la verdadera evolución no consista en crear más reglas, sino en desmontar aquellas que ya demostraron ser inútiles.
En abandonar el moralismo patético y falso que divide, etiqueta y empobrece el espíritu humano.

Porque la vida no pide permiso.
Nunca lo pidió. Nunca lo pedirá.
Y seguirá sucediendo —a pesar de las reglas, de los dogmas y de quienes se niegan a evolucionar.

Nacidos bajo cualquier circunstancia, todos deberían reconocer que sus padres —hombres y mujeres— desafiaron contextos, ejercieron el derecho primordial de procrear y, por ello, no merecen etiquetas de promiscuidad o irresponsabilidad.
Por el contrario: fueron mentores de la vida.

Comprender que los padres son instrumentos del universo —canales entre el plano espiritual y el plano físico— exige reconocimiento y respeto.
Esto trasciende contextos sociales, económicos y culturales.
Es, ante todo, un principio de la propia vida.

Leave a Reply

Your email address will not be published.