Brasileiro portador da dupla nacionalidade alerta que o princípio de reciprocidade evocado pelo presidente Lula preocupa quase 2 milhões de compatriotas ilegais nos Estados Unidos
Por MONTEZUMA CRUZ
Quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024 – 15h58
Atuante na campanha de reeleição do ex-presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, o brasileiro Samuel Sales Saraiva criticou hoje, 15, a medida que voltou a exigir visto de americanos e defendeu a aplicação do mesmo princípio a cidadãos estrangeiros em situação irregular naquele país. Saraiva, rondoniense que mora há três décadas na área de Washington, D.C. dirigiu-se ao Comitê Nacional Republicano para fortalecer a convocação do chamado princípio da reciprocidade em relação aos quase 2 milhões de brasileiros indocumentados nos EUA.
“Tal princípio foi citado por Lula para justificar a exigência de visto de turista a cidadãos americanos”, lembrou. “Gostaria de saber o número de imigrantes norte-americanos que conseguiram no passado visto de turista com propósito fraudulento de permanecer no Brasil ilegalmente, ou entraram pela fronteira da Amazônia de forma criminosa”, assinala.
Em carta aberta a Trump “e patriotas”, Saraiva diz que é observador do processo legal de naturalização e das leis vigentes, razão pela qual invoca o cumprimento dos “deveres impostos pela consciência cidadã e a responsabilidade de contribuir com os interesses do país ao qual hipotecou lealdade.” “Os EUA talvez sejam a nação mais generosa no acolhimento de imigrantes que atendem o perfil de imigrantes que o país busca”, elogia. Os números de concessão de vistos comprovam.
A intenção da carta é contribuir “com a campanha de reeleição de Trump”, assinala Saraiva. Manifestando: “Acredito que a manutenção da legislação atual e o postergamento de tão inadiável discussão continuará incentivando e facilitando a invasão territorial justificada por alguns setores com a narrativa de imperativos de natureza humanitária, ignorando dessa forma o postulado segundo o qual uma nação que não protege as suas fronteiras assume o risco de debilitar-se e, no futuro, talvez não existir como nação.”
Com a visão de imigrante adquirida na experiência de três décadas nos EUA, Saraiva pondera a respeito de alguns argumentos fundamentais, e possivelmente não percebidos pela maioria dos cidadãos nascidos nos EUA. “Se considerados, eles podem promover a convergência de apoio suprapartidário nas discussões futuras, visando encontrar uma resposta justa, humanitária e apropriada ao atendimento harmônico da complexa questão migratória, sem atropelos ao império das leis que regulam o funcionamento do estado democrático de direito”, acredita.
“As leis precisam ser adaptadas em consonância a dinâmica da sociedade e dos novos tempos, sob pena de se tornarem sem eficácia, ou mera abstração de direito, deixando um vácuo de autoridade e poder”, alerta. Lembra que, desde a adoção da Constituição dos EUA em 1788, e a convocação do Primeiro Congresso em 1789, a realidade mudou e a adequação das leis tornou-se um imperativo inquestionável, para evitar prejuízos, alguns, talvez irreparáveis.
“A questão da cidadania e outros desafios em relação à complexa questão da imigração precisam ser enfrentados com debate democrático e corrigidos sem contaminação política, partidária ou ideológica, porque são elementos fundamentais inerentes à própria soberania nacional, hoje, ameaçada”, diz o brasileiro.
Saraiva propõe que seja ouvida a voz das ruas e tentar, sensíveis aos anseios de parcela majoritária da população nacional, para compreender assim o alcance daquilo que precisa ser revisto. “É imperativo, é uma demanda legítima e inadiável que merece a atenção dos legisladores”, assinala.
“TURISMO MATERNIDADE”
Ele toca no aspecto igualmente preocupante: a prática vigente que vem sendo usada pela elite endinheirada de países latino-americanos, com o objetivo de ir aos EUA apenas com visto de turista e a intenção de obter privilégios amorais.
“E assim, as mulheres têm filhos aqui, obtendo o direito à cidadania americana, para depois regressar a seus países com a garantia de que esses novos cidadãos que não vão residir em seus países tenham o direito de entrar nos EUA quando desejarem, e uma aposentadoria assegurada pela agência de Seguro Social”, alerta.
Para Saraiva, é injusta a falta de correção da legislação atual que permite a concessão automática de cidadania a filhos de estrangeiros, cujos pais nunca residiram nos EUA “e aqui chegaram incentivados por campanhas publicitárias criminosas, mediante práticas escancaradas tais como o do “Turismo Maternidade.”
“Injusta para com os pagadores de impostos condenados a arcar com pesados custos resultantes dessa brecha jurídica”; o bom senso e a iniciativa daqueles a quem cabe a responsabilidade patriótica e moral de proceder a uma revisão das leis com vista à adaptação da legislação em vigor deve corrigir essa distorção que tem facilitado e incentivado a imigração em grande escala, garantindo a cidadania automática aos filhos dos imigrantes que aqui chegam ilegalmente intencionalmente dispostos a garantir-lhes a residência permanente, bem como a cidadania, depois que as crianças aqui nascidas alcançarem a idade de 21 anos”, reforça.
O brasileiro entende que a “Lei de Cidadania” (de 1802) “pode e precisa ser revisada com urgência pelo Congresso.” Isso implicaria o exame de revogação, a garantia de cidadania aos filhos de indocumentados nascidos nos EUA, de igual maneira aos filhos de cidadãos estrangeiros nascidos no país onde nunca residiram e talvez voltem algum dia para usufruir de um benefício sem méritos, lealdade à nação ou compromisso.
MODELO SUIÇO
Alguns países adaptaram suas legislações sobre a concessão de cidadania às crianças nascidas no país. Na Suíça, por exemplo, um bebê nascido de pais estrangeiros não adquire automaticamente a cidadania. No entanto, poderão tornar-se cidadãos suíços se cumprirem determinadas condições.
A lei prevê ainda a perda da cidadania a crianças ou cidadãos que não residam no país há pelo menos cinco anos.
Para Saraiva, a adoção desse critério nos EUA poderia permitir o cancelamento da cidadania adquirida de forma oportunista e antiética a todos os que intencionalmente, aproveitando-se do turismo maternidade” se aproveitaram das falhas da legislação vigente, a fim de obter de maneira desonesta o privilégio e as vantagens legais da cidadania americana.
STATUS COMPATÍVEL
O modelo ideal seria que as crianças nascidas nos EUA, filhas de estrangeiros, tivessem garantido o mesmo estatuto de imigração que os seus pais. Se forem cidadãos americanos, seus filhos continuariam com o direito à cidadania automática; se forem residentes permanentes receberiam a mesma classificação de residentes de seus pais, ou, dependendo do tipo de visto que possuírem, recebendo a nacionalidade e os passaportes dos países da nacionalidade do país de origem.
PRINCÍPIO DA RECIPROCIDADE
“O Brasil voltou a exigir o visto para turistas estadunidenses. Essa exigência havia sido suspensa em 2019 e foi adotada sem nenhuma razão justificável, pois além de prejudicar a convergência de turismo ao país, causando perdas consideráveis a este setor da economia, pune o turista americano com exigência descabida e desnecessária, já que não há evidência de que cidadãos americanos viagem ao Brasil com a intenção de burlar as leis e permanecer ilegalmente”, diz ainda Saraiva.
Na opinião dele, o governo brasileiro tomou a decisão de maneira parcial alegando o princípio da reciprocidade para atender ao manjado discurso populista anti-americano. “No entanto, ao analisar a medida, não levou em consideração a realidade vivida por aproximadamente 2 milhões de cidadãos brasileiros em situação irregular no país – a ilegalidade.”
O que, segundo Saraiva, caracteriza usufruto das vantagens possíveis; abuso do sistema e da hospitalidade; e sobrecarga do sistema de saúde, hospitalar e prisional; além de ocuparem trabalhos que poderiam ser exercidos por imigrantes legais de outras nacionalidades. “Obviamente, os EUA estariam no direito de reivindicar o mesmo princípio e enviar seus cidadãos para o Brasil, nas mesmas condições de ilegalidade e proporção numérica, e o alerta já foi dado no Comitê de Campanha Republicano e anteriormente pelo Governador DiSantis e outros proeminentes líderes republicanos e democratas”, explica.
Saraiva acredita que o debate sobre uma reforma imigratória, desde que “condizente e justa”, ofereceria resultados positivos a longo prazo. Para ele, não basta fechar a fronteira se os incentivos continuam atrativos e vigentes. “Isso apenas tornará mais difícil o acesso ao alardeado ‘sonho americano’, que, praticado de forma ilegal, acena com a vivência de um pesadelo”, acrescenta.