Brasileiros no exterior

O MONSTRENGO CRIADO PELO ITAMARATY CHAMADO CRBE

Sem legitimidade, mas vorazes, “conselheiros” e “suplentes” eleitos por email brigam entre si, atacam seu criador em busca de mordomias, passaporte diplomático, medalhas do Rio Branco, passagens em classe executiva e hospedagem em hotel cinco estrelas.

Washington DC Área – 21/04/2011 — Como intróito, gostaria de enfatizar que milito na defesa dos brasileiros no exterior há aproximadamente dezoito anos e, em função dessa militância, conheço in loco os problemas e anseios dos emigrados, em particular dos que receberam o “rótulo” consular de “Indocumentados”.

Quanto ao mais, é notória a minha oposição à atual forma de representação dos brasileiros na diáspora, instituída por decreto no apagar das luzes do Governo Lula na forma de Conselho de Assessoramento, consultivo subordinado ao MRE, decreto esse que atropelou as prerrogativas constitucionais do Congresso Nacional, que é o Poder Legiferante.

Entendo que órgão de assessoramento não tem força, é quase anódino, pois quem pede conselhos não se obriga a eles e age como quer, segundos seus interesses ou seu melhor entendimento. Assessor pode ser até simples cargo decorativo, como já se viu na República brasileira, sendo famosos os rotulados de ASCONE = Assessor de Coisa Nenhuma.

Por outro lado, o “assessoramento” para o qual foi criado o CRBE, a teor do art.4º do Decreto 7.214/2010, faz dele um órgão meramente opinativo, sem qualquer poder de impor-se. Lá adiante, no parágrafo 3º, subordina ao MRE a eleição de seus membros. Assim sendo, o CRBE, por vício de origem, fará sempre o que o pessoal do MRE mandar. O Conselheiro não tem opção, fora de dar palpite, nada obstante o valor de sua manifestação.

A Criatura só se volta contra seu Criador quando vislumbra alta possibilidade de vir a ocupar seu lugar ou tirar-lhe proveito, seja qual for o método. Não sendo essa a hipótese, a lealdade primária das figuras biônicas, como foram alguns senadores sob o Regime Militar, é para com o Poder que os escolhe e não para com os representados, cabendo lembrar que a figura do Senador Biônico, nas Américas, foi invenção dos “Founding Fathers” nos albores da Independência americana, como mecanismo de contornar pressões populares na “House of Representatives”.

Por que o Governo Petista foi pressionado a utilizar o mesmo instrumento autoritário do decreto, que condenava nos heróicos anos de oposição, para instituir o CRBE? Aliás, o CRBE é apenas um detalhe nessa peça. Certamente o nascimento desse órgão pela via cesariana da decisão monocrática e sua subordinação ao MRE o tornou, a meu ver, sem pretender ser dono da verdade, nem, menos ainda, ferir o brio dos Conselheiros, um órgão que não representa a maioria dos brasileiros que vivem no exterior, as massas de trabalhadores comuns.

O decreto que lhe deu existência também o tornou eunuco “ab ovo” ao lhe retirar força para agir de modo independente e poder cobrar, como quem tem direito, não como quem pede, sugerindo, de chapéu na mão, providências das autoridades diplomáticas. Também não pode criticar, encaminhando denúncias ao Brasil, quando fosse o caso, inclusive ao Congresso Nacional, para a fiscalização devida. Só uma representação independente reúne condições para realizar essa ingente tarefa.

Vi e vejo esse decreto como manobra para esvaziar as duas propostas de emenda à CF em trâmite no Congresso — uma de autoria do Senador Cristovam Buarque (instituindo a eleição de parlamentares pelo sistema majoritário) e outra do Deputado Manoel Junior (pelo sistema proporcional), — por mim sugerida — que propugnam, entre outras coisas, pela representação política dos brasileiros que vivem no exterior. É essa representação que efetivamente nos daria voz, força, respeito e poder para reivindicar nossos interesses junto às nossas representações diplomáticas e ao Governo também, diretamente. Um órgão de “assessoramento” como o CRBE só pode dar pitaco, não podendo ir além dos sapatos, como na história do sapateiro que, chamado a opinar sobre o calçado da figura pintada, quis ir além, comentando o resto.  Aliás, o que pretende o MRE? Ausência de fiscalização, por saber que esta é melhor no interesse popular; contornar o risco de exposição à quebra de confiança, o que aconteceria se sua contabilidade passasse pelo crivo de especialistas alheios a seus quadros ou à sua influência.

Desejo registrar também que minha oposição é objetiva, visa ao Conselho, como entidade, não aos nobres Conselheiros, que presumo todos bem intencionados e alguns até pragmáticos, pois é certo que o CRBE  é melhor do que nada, mas não é o que a maioria (democracia é sempre o princípio da maioria, que, nada obstante, deve respeito às minorias)  de nós desejaria como órgão que possa efetivamente representar nossos interesses.

De fato, nos debruçamos sobre a legalidade desse decreto 7.214/10 à luz da Constituição Brasileira e da Convenção de Viena, de sorte que nossa crítica se direciona ao sistema e não aos operadores do CRBE. Quem sabe o Judiciário possa vir em nosso socorro?

Pugnamos, enfatizo, pela representação política no Congresso brasileiro, pois os exilados econômicos, a maioria, envia bilhões de dólares aos cofres do país que deixaram para trás, sem contrapartida. Os custos de sua sonhada e merecida representação política no Congresso do Brasil (somos cerca de 3 milhões) são mínimos, e sequer seriam uma compensação. O CRBE tem seus conselheiros escolhidos a dedo pelo próprio MRE entre cupinchas — religiosos, doutores, empresários de estatais —, mas nenhum trabalhador da construção civil, nenhum diarista, nenhum “indocumentado”, ou seja, nenhum representante de mais de 70% dos que enviam dinheiro ao Brasil para ajuda aos que ficaram também em sua saudade.

Por conta de minha postura política e visão de nossos direitos e deveres como emigrados, formadas na oposição durante o Regime Militar, a partir das eleições para o CRBE passei a receber denúncias que vão desde irregularidades na votação até gastos sem prestação de contas. Ora, não detendo qualquer poder de polícia, que também falece ao CRBE, só me cabe denunciá-las, quando consistentes, plausíveis, a quem o tenha, para as devidas averiguações.

DECRETO QUE CRIOU O CRBE é RANçO DO AUTORITARISMO

Sem qualquer ânimo de ferir suscetibilidades, mas, por outro lado, achando que seria covardia, pusilanimidade, esconder opinião que considero correta, gostaria de chamar atenção para o fato de que o CRBE surgiu no bojo do Decreto 7.214/2010, no seu artigo 4º, como nascimento via cesariana, no local errado, e não por parto normal, no ambiente apropriado, que é o Congresso Nacional.

Nem se pode dizer que esse Decreto é uma norma jurídica saudável em sua forma. Sendo deficiente, não goza de plena eficácia. Com efeito, falta-lhe uma das propriedades essenciais a qualquer norma jurídica: a SANÇÃO.  Norma sem sanção expressa à desobediência de seu comando NÃO É NORMA JURÍDICA.  Portanto, o Decreto em tela nada mais é que uma recomendação ao pessoal do Itamaraty, um amontoado de sugestões, nada mais. Quem tem assessor o ouve ou não.

Por isso a importância da representação política no Parlamento brasileiro. Essa sim terá força, poder de fogo. Os atuais “conselheiros” poderiam ser Representantes da Diáspora no Congresso, Membros de um PODER, em vez de membros de simples órgão opinativo, palpiteiro, visto com condescendência pelo corpo diplomático.

ÉPOCA DENUNCIA CRBE COMO IMPRODUTIVO

Na edição de 20/04/2011, a conceituada revista Época, associada à Rede Globo, publicou séria denúncia intitulada “UM CONSELHO DESACONSELHÁVEL”, produzida pelos jornalistas Eliseu Barreira Junior e Letícia Fenili, destacando que “Até agora, seus membros mais brigam que ajudam os brasileiros que vivem lá fora”. A matéria também enfatiza que “Em quatro meses de vida, porém, boa parte dos 16 conselheiros titulares e outros 16 suplentes têm gastado seu tempo com questões irrelevantes para os 3 milhões de brasileiros que vivem no exterior”. E o pior, o foco do debate se divide entre disputa por passagens aéreas, reivindicação de passaporte diplomático e impressão de cartão de visita com versículos bíblicos, como se o Poder Público devesse favorecer uma ou outra religião, em detrimento do Estado laico. Verifica-se um verdadeiro carnaval de absurdos à custa dos pesados impostos.

Conforme a matéria, para o professor da PUC de Minas Gerais, Duval Fernandes, especialista em migração internacional, “a melhor proposta seria ampliar o direito a voto dos emigrantes, que atualmente só participam das eleições presidenciais. Assim, eles teriam representantes no Legislativo com real empenho na defesa de seus interesses”. Uma tarefa que os membros do CRBE demonstraram que não possuem qualificação para cumprir.

Gasto abusivo de recursos públicos

Para a silenciosa, porém observadora maioria dos imigrantes que não se sente representada, o CRBE é uma grotesca aberração desde o início de sua formação, conduzido sem transparência alguma. Indaga-se: onde estão publicados os detalhes financeiros da viagem a Brasília, e qual seu o custo para o erário? Que tipo de apoio financeiro foi prestado àqueles candidatos que concorreram protegidos pelos consulados apenas por serem amigos e bajuladores?

Um volume considerável de informações veiculadas na internet e produzidas por alguns membros do próprio Conselho de Representantes de Brasileiros no Exterior, contendo indícios latentes de violações aos princípios da moralidade, eficiência e impessoalidade previstos no caput do artigo 37 da Constituição Federal, motivou o Advogado Maurício Gomes Pinto, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo, a redigir denúncia ao Procurador Geral da República, Doutor Roberto Monteiro Gurgel Santos, sugerindo investigação.

Para Maurício, “o elevado custo do transporte e estada de todos conselheiros será pago com dinheiro público em virtude das prerrogativas conferidas pelo Decreto Presidencial 7.214 de 15/6/2010, cujo gasto não se justifica, tendo em vista as necessidades do Brasil”. E indaga: “Como podemos nos dar ao luxo de pagar passagens em classe executiva para um determinado segmento consultivo do Itamaraty, quando há brasileiros no exterior que rastejam por ajuda do governo brasileiro?”

Ressalta, ainda, a seguinte discrepância: “quando um brasileiro morre no estrangeiro, o MRE alega que não possui recursos para pagar o traslado do corpo, mas, por outro lado, autoriza o gasto de milhares de dólares para trazer os Conselheiros ao Brasil para participarem da referida Conferência.” Recorda ainda que “estamos na era da tecnologia, logo, e em obediência ao princípio da eficiência, não seria o caso da participação desse seleto grupo através de videoconferência? E dispara: “Isso demonstra uma prática nefasta e ainda arraigada no Estado, qual seja, o péssimo uso do dinheiro público. Irregularidades e o peleguismo dos ‘Conselheiros’ do CRBE, que irão ao Brasil em classe executiva para fazer turismo é, a meu ver, um prêmio do MRE pela submissão a seus desígnios.”

“É dinheiro do imposto indireto que nivela o pobre e o rico, ambos pagando alíquotas iguais, e que poderia ser usado com proveito social em benefício das crianças de nossas regiões mais pobres, que às vezes recebem aula à sombra de mangueiras e caminham léguas para chegar à escola sob sol escaldante, muitas vezes com fome, ao som do ronco estomacal.”

POR QUE REPRESENTAÇÃO POLíTICA EM VEZ DO CRBE

Portanto, minha luta não é casuística, nem pessoal, nem egoísta.  Fiz política na Oposição, no tempo do chumbo grosso; presidi em Rondônia, como fundador, o PDT, por indicação de seu criador nacional, Governador Leonel Brizola.

Então, voltando às considerações iniciais, por que devemos nos contentar apenas com um Conselho?  O CRBE, nada mais é que um cala-boca, pirulito pra criança, algo que nenhum Conselheiro é. Eu, menos ainda. O CRBE é destituído de poder real, pois apenas dá palpite, que pode ser ignorado ao alvedrio do Chefe, o Corpo Consular; é um poder ínfimo, que não se impõe, não resolve. É melhor do que nada? Sim, é melhor.

Vamos todos, ora pois, sem disputas pessoais, especialmente aquelas mesquinhas — aquilo que os americanos chamam de “mud sling”, onde todos saem sujos do episódio — unir forças em torno das PEC, seja a do Deputado Manoel Junior, seja a do Senador Cristovam Buarque. Ambos fundamentaram bem suas respectivas propostas que tramitam apensadas. Ao invés de debater possibilidades, escolhi agir, achando que cumpro com meu dever de cidadão, ao mesmo tempo em que busco fazer NOSSA VOZ, a de todos os brasileiros na Diáspora, ouvida no Centro de Poder do nosso querido Brasil, inesquecível Pátria, não importa os defeitos que carregue.

Em que minha posição merece censura?  Porque alguns me consideram uma espinha de peixe na garganta? Falta de informação? Só pode ser!  Sequer pretendo ser candidato. Trabalhei no Legislativo Federal por bastante tempo e não tenho desejo de voltar pra lá.

Torço para que os dedicados membros do CRBE se empenhem, do jeito que puderem, somando esforços, com vistas à aprovação da PEC do Deputado Manoel Jr. ou a do Senador Cristovam Buarque. A representação política no Congresso constitui-se uma demanda legítima, e não favor ou concessão que precisa ser atendido, pois, ao Congresso, cabe cumprir suas prerrogativas em relação à representação política, o que deve ser feito sem açodamento e através de amplo debate entre Estado e Sociedade.

A IMPORTÂNCIA DO PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR 559/2010

Os “itamaratianos” foram os primeiros a resistir à PLP 559/2010, e atropelar o debate no Congresso sobre representação política, PEC 436/2009, induzindo o ex-presidente Lula, a criar POR DECRETO, o mesmo instrumento antes execrado, em especial no Regime Militar, o ser teratológico que se esconde sob a sigla CRBE.

A “Teoria de Sistemas” nos ajuda a entender a conveniência do ensaio de uma idéia que se lança para que diferentes atores se manifestem e assim ensejem a oportunidade de correção dos rumos mediante a eliminação dos pontos de conflito, ao mesmo tempo em que se procura estabelecer a convergência de mecanismos que a aperfeiçoem.

Tentamos por em prática esse ensinamento com o PLP 559/2010. Após a discussão nas comissões técnicas na Câmara, sugeri ao Dep. Manoel Jr. a supressão dos dois artigos que foram alvo de clara oposição de alguns grupos. Um deles atrelava as remessas à obrigatoriedade de quitação eleitoral, para atender a legislação brasileira, pois o cidadão deve votar, não importa onde esteja. O outro fixava a alíquota de 2% sobre as remessas efetuadas, dinheiro que reverteria aos remetentes em forma de benefícios em situações emergenciais. A eliminação desses dois obstáculos abriria as portas ao consenso.

As diretrizes vigentes no MRE para atendimento aos brasileiros no exterior foram concebidas há décadas, não acompanharam a dinâmica social, não espelham a nova realidade da economia brasileira e são incompatíveis com a demanda da diáspora em níveis atuais, muito superior em termos percentuais se comparada à emigração de trinta anos atrás.

O recente episódio do poderoso terremoto/tsunami no Japão coloca em evidência a necessidade de adequação dessas diretrizes à nova realidade da emigração brasileira. Os consulados foram pegos de calça curta, ou de “pants down”, como dizemos aqui nos EE.UU, termo mais forte, sem a menor condição de atender sequer pequena fração da demanda posta pelos brasileiros atingidos naquele País.

ARROGÂNCIA E INEFICIÊNCIA NO ATENDIMENTO CONSULAR

As denúncias de mau atendimento a nós brasileiros no exterior se acumulam há anos a fio sem que ninguém no Congresso tenha tido a iniciativa de coletar assinaturas para uma CPI que investigue as ações do serviço consular. As contas da Defesa e do MRE não têm controle externo, me parece, de sorte que o pessoal diplomático que autoriza despesas esbanja o dinheiro público a seu talante, sem maiores preocupações, dentro de seu limite orçamentário.

A atenção que o corpo diplomático dispensa ao povo brasileiro no exterior não é a mesma com que distingue um Mandatário dele no Congresso Nacional.  Para conosco, brasileiros da Diáspora, é distante e indiferente, ou até aborrecido o contato, quando permitido, porque nos vê como gente incômoda, ressalvando-se a sensibilidade de alguns funcionários empáticos. A maioria se coloca acima do Povo a quem devem servir, sendo paga para isso.

Talvez seja uma tendência inerente ao ser humano a arrogância de quem detém o Poder sem sofrer qualquer ameaça de defenestração por ineficiência, sequer uma reprimenda, nenhuma fiscalização. Não foi à toa que Montesquieu observou a necessidade da divisão de poderes que se controlem mutuamente, porque quem o detém se inclina a abusar dele, até que encontre oposição de outro equivalente em força. Daí o valor inestimável do Legislativo com seus representantes eleitos, com voz nacional, e de um Judiciário independente e altaneiro.

Como cidadão residente no exterior, cônscio da responsabilidade cidadã, desejo ver meus compatriotas tratados com dignidade, amparados em suas necessidades mínimas quando se vêem ao abandono do sistema legal do país onde vivem, como ocorre freqüentemente.

NECESSIDADE DE UMA COMISSãO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO

Um parlamentar sensato e corajoso poderia coletar assinaturas entre seus pares para investigar esses gastos no Exterior e o desperdício, sem deixar de levar em consideração a conveniência de seu Mandato, que é devolvido ao povo a cada quatro anos.

Sei que nem sempre podemos fazer o que gostamos ou o que está de acordo com nossa consciência, porque estamos sujeitos a outras forças, de sorte que a direção e o sentido serão os da maior delas, segundo as leis da física. É sempre necessário ver as coisas sob a ótica da reeleição, para que a voz dos parlamentares não seja calada ou abafada.

O MRE sempre deteve os meios e a influência para abafar escândalos e manter imunidades contra fiscalizações, pairando acima do bem e do mal; deseja continuar aceito na base da confiança, atropelando o sábio conselho de Lênin: “A confiança é boa, a FISCALIZAÇÃO É MELHOR”.

Seja como for, com as devidas cautelas, sou de opinião que denúncias mais sérias deveriam ser investigadas por quem de direito na estrutura governamental, até para que não pairem dúvidas sobre a idoneidade do acusado, dúvidas que permanecerão se a luz da investigação oficial não for espargida sobre a realidade factual.